segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

Sentido ausente - Aisha

Pairava ali, o olhar distante do próprio corpo a fitar um horizonte que não podia alcançar. Em pé, entre a areia e o mar, mergulhava em secos sonhos a esperar pelo sol que se negava a chegar.

Ultima estrela no céu... Ultimo sonho na terra e mais um passo rumo ao destino não tão certo, mas já existente numa consciência agora liberta de toda tormenta.E a paz, apenas a paz, dada somente aos que conhecem a verdade do que são.
Os pés descalços sentem a primeira onda, água fria abraçando uma vida até então também fria de toda e qualquer emoção.

Os olhos ainda pairam ao longe do corpo que parece não mais existir.
Acorda o espírito ao toque frio das mãos do inverno que as águas abraçaram, uma gota do mesmo mar escorre-lhe pela face que tantos sonhos guardou em si.
Sente o gosto do sal e percebe-se como parte do imenso universo estendido à sua frente, líquido, o mesmo frio que tem nas emoções guardadas em si.

Tudo passa a ser uma continuação da vida que mal pode conhecer, ou viver...
Os olhos buscando ao longe um ponto sequer que lhe mostre um som, um tom ou mesmo a melodia que nunca conseguiu ouvir, param sua busca, entregam-se e derramam-se ao mar que os recebe com o acalanto sonhado em terras secas.
A pele, cada poro, sente apenas o abraço das ondas que lhe recebe plena e harmoniosamente.

E o silêncio...
Nada se ouve, nada mais é sentido. Pára a vida na melodia silenciosa que o pranto ecoou nas brumas formadas entre um corpo e a dor.
O universo líquido aquece o espírito, abatido, curando-lhe as feridas que na vida alcançou. Tudo passa a ser o nada nunca antes pensado ou almejado.

E mais uma vez, o silêncio, apenas o silêncio e o azul que começa a perder a cor...
E assim fecham-se os olhos, já sem cor, que tanto esperou poder encontrar a razão de sua busca... Fecham-se os olhos e fecham-se também os sonhos calando o canto que o mundo nunca pode ouvir...
Fecha-se o mundo na entrelinha da vida que nem ao menos conheceu a poesia do que é ser feliz.

E voa o corpo nas ondas firmes de um mar perdido entre o sonho e a razão, sente ainda o toque das asas que o recolhem na suavidade que nunca conheceu.
Vê-se então como parte de um todo, uma obra, seu apogeu.
Às águas salgadas do mar, derrama seu pranto no silêncio que sempre foi, misturando-se a mansidão que sempre buscou, sente-se agora na plenitude de uma vida que nunca conheceu.

E assim, fecham-se as cortinas no ato derradeiro que delimita o fim.
No último adeus, um som invadindo o silêncio que já se fazia existir na própria voz que agora, num último som, brada por perdão.
*Aisha*

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